Ainda a propósito do dia do Corpo de Deus, importará dizer, que
pelas razões que todos conhecem, este é o último ano em que o mesmo é feriado
em Portugal.
Este facto leva-me a tecer algumas considerações a propósito
desta circunstância.
Desde logo para dizer que há países onde, à semelhança do que
acontecia em Portugal, esta solenidade de natureza religiosa é feriado
nacional; mas também há exemplos de Estados onde o mesmo já foi feriado e
atualmente não o é.
Por outro lado, em termos estritamente religiosos, parece-me que
o desaparecimento do feriado e a transferência da celebração festiva para o
domingo seguinte é perfeitamente razoável. Assim já acontece com outras
festividades onde a celebração litúrgica não coincide com a data do acontecimento
referenciada pela tradição cristã. Estou a lembrar-me por exemplo do dia de
Reis.
Dito isto e pensando, repito, na pura prática religiosa,
parece-me que os crentes e particularmente os devotos do Santíssimo Sacramento,
não deixarão de o ser pelo facto de este dia deixar de ser feriado.
Ainda assim, não posso deixar de notar que em muitas terras do
nosso país, que se engalanavam (e de que maneira) para comemorarem esta
festividade, existe hoje um sentimento de que se perdeu um acontecimento que
fazia parte da sua tradição histórico religiosa e que era celebrado num dia de
calendário especial.
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Tapetes de Flores na festa do "Corpo de Deus" - Caminha |
Admitir este facto leva-me a constatar que as medidas
que o Governo tem tomado (ou tem sido obrigado a tomar) começam a atingir os
portugueses numa dimensão muito mais profunda que o indesejável “ir-lhes ao
bolso”. E isso é mau, muito mau.
E no caso do corte dos feriados, parece-me que essa
situação se torna evidente, pois falta demonstrar, em termos económicos, que o país
venha a beneficiar com tal medida. Pelo contrário, tenho ouvido opiniões de
gente muito informada (e bem formada), que garante que esta medida não terá
qualquer impacto na economia real. E mais, garantem também que há países com economias
bem mais desenvolvidas que a nossa onde o número de feriados até é superior.
Posto isto, e com o devido respeito por quem pensa de
forma diferente, julgo que num país civilizado o aumento da produtividade nunca
poderá ser alcançado com a degradação do bem-estar dos trabalhadores.
A diminuição do custo do fator trabalho parece-me que poderá
ser suficientemente conseguida pelos ajustamentos no mercado laboral, pois a
oferta de trabalho (por parte dos trabalhadores) supera em muito a procura do
mesmo (por parte dos empregadores) e esta realidade conduz necessariamente a um
abaixamento do preço de equilíbrio no mercado, facto que, por si só, já permite
que as empresas adquiram trabalho a preços significativamente mais baixos.
Não valorizar adequadamente a realidade económica e
social do país e tomar medidas com impacto na vida das pessoas que vão muito para
além da questão económica e cujos benefícios não estão suficientemente
comprovados, pode ferir de morte a credibilidade do Governo.
Passos Coelho disse, um
dia destes, admirar a paciência dos portugueses. Mas o primeiro-ministro deve
lembrar-se que a paciência é um recurso limitado e que tende acabar com o uso
frequente...