Nos últimos dias o Governo divulgou um conjunto de medidas para estimular a economia e combater a crise. A crise que se vem manifestando de diversas formas e que se prevê possa ser agravada no próximo ano, com uma possível recessão, provocada pelas medidas de austeridade impostas para equilibrar as contas públicas.
Neste contexto uma das medidas anunciadas é um pacote legislativo e financeiro que visa estimular a reabilitação urbana, nas grandes cidades do país.
Ora aí está uma medida que defendo há muito tempo. Há anos que venho reclamando uma reabilitação do parque habitacional e histórico das nossas cidades e vilas, que de tão degradado se encontrar, em muitos casos, tem levado à desertificação e descaracterização dos centros históricos de muitas delas.
A quem já não aconteceu passar em ruas, nos centros das nossas cidades e vilas, em que as lojas à face da rua são as únicas fracções dos prédios em condições de fruição, porque todas as demais, nomeadamente as dos pisos superiores, estão completamente devolutas?
Há também muitos anos, que venho dizendo que as nossas empresas de construção, esgotado que está o mercado nacional da construção de casas novas, e das obras públicas, se deviam especializar num segmento de mercado virado para a reconstrução e manutenção de edifícios (urbanos ou outros).
Sendo esta medida convenientemente implementada e tendo ela os efeitos que se lhe podem antever, estaremos a contribuir para a preservação e humanização das nossas cidades e vilas.
Mas atenção, esta medida, por si só, não vai resolver os problemas estruturais do nosso país.
Fico triste e desiludido quando vejo alguns comentadores, a quem até reconheço competência técnica, declararem que o Governo, com esta medida poderá ter descoberto o ovo de Colombo, para a saída da crise. Que com este plano vamos reduzir significativamente o desemprego, nomeadamente no sector da construção.
Ora bem, pensar assim parece-me uma ilusão.
A reconstrução e manutenção de edifícios nas nossas cidades e vilas (e porque não aldeias) é uma actividade que pode absorver grande quantidade da mão-de-obra, sobre tudo numa fase inicial do processo, mas à medida que o programa avançar, com certeza que o volume de empreitadas também vai diminuir. Não tenhamos ilusões, o que já está feito, não falta fazer! E nessa altura lá virá de novo o desemprego no sector da construção.
O que o país precisa é de ter menos mão-de-obra ligada ao sector da construção. É preciso “pegar” nesta gente, que hoje está ligada a este sector, e distribui-la por outros sectores actividade, onde o país também possa dar cartas. Quiçá no sector produtivo, na indústria, na agricultura e pecuária, nas actividades ligadas ao mar...
Portugal necessita de um novo paradigma de desenvolvimento económico, assente na produção de bens transaccionáveis (quero dizer bens que possam ser vendidos ao exterior). Bens esses que até podem ser produzidos em sectores tradicionais, o que é necessário é que se aposte na qualidade e inovação. O sector do calçado tem sido, nos últimos anos, um bom exemplo disso mesmo.
Mas em paralelo o país também tem que reduzir, tão rápido quanto possível, a sua dependência do exterior, repondo níveis de auto-suficiência que já teve no passado, para equilibrar a sua balança comercial.
Enfim, a reabilitação urbana é uma boa medida, mas o país tem que produzir mais, para que possa vender mais e também consumir mais...