domingo, 22 de julho de 2012

Os incêndios florestais em Portugal

Nos últimos dias o nosso país tem sido flagelado, mais uma vez, pelos incêndios florestais. Esta calamidade vem-se repetindo, ano após ano, com custos económicos, ambientais e até com perda de vidas humanas.
O que me angustia, há anos, é aparente indiferença com que a nossa sociedade olha para este problema.
Os portugueses habituaram-se a conviver com as notícias dos fogos florestais, em épocas mais ou menos definidas no calendário e tirando as notícias de perdas de vidas humanas, tudo o resto se assemelha a peças de um circo mediático que todos os anos se monta em alturas definidas, tal como um acontecimento desportivo ou cultural. Esta espécie de rotina que se tem instalado ao longo de décadas na nossa sociedade tem levado a uma acomodação coletiva perante o drama dos fogos florestais. Isso é mau, muito mau.
Para esta situação muito terão contribuído as alterações estruturais que foram acontecendo no nosso país ao longo das últimas décadas, transformando-o num território com um número crescente de aglomerados urbanos e a consequente deslocalização das populações do mundo rural.
Esta dinâmica demográfica reflete-se na forma como a nossa sociedade encara a questão dos fogos florestais. Por um lado, como a calamidade atinge particularmente as zonas rurais o problema localiza-se geograficamente longe da zona de influência de uma parte, cada vez mais significativa, da população. As chamas vêm-se nas imagens televisivas mas não atingem as varandas nem os logradouros dos prédios citadinos e nessa medida uma grande parte da nossa população olha para o problema como espectador e não com um interesse sentimental particular, como o de um proprietário ou de um habitante das localidades atingidas. Por outro lado, a não convivência com a realidade rural, torna as populações menos sensíveis à questão económico-ambiental. Ouvir dizer que um pinheiro bravo leva 30 a 40 anos a criar, até que tenha valor económico, é um dado que as pessoas assimilam, mas que não complementam com uma imagem visual (diária) do crescimento lento das arvores, ao longo de décadas. Ouvir dizer que a área ardida atinge anualmente números elevadíssimos, ainda que possa ter impacto noticioso, não é mesma coisa que viver a experiência de percorrer montes e vales, completamente despidos de floresta e recordar os tempos em que os mesmos eram povoados por vegetação. Ouvir dizer que os incêndios destroem os ecossistemas, ainda que possa ter igual impacto, é diferente quando comparado com a realidade rural de quem não pode ir ao monte apanhar uma urze ou um azevinho e ouvir os melros, as rolas ou as cotovias... e ver raposas, ouriços-cacheiros ou carreiros de formigas.
Enfim, estou em crer que a ausência de contacto com a realidade física (e quotidiana) das florestas e do mundo rural, leva a maioria das pessoas a um estado de passividade cívica perante a questão dos fogos florestais, por via de se não sentirem diretamente afetados pelo problema. E volto a repetir, isto é mau, muito mau.
E o que é pode ser feito para alterar este estado de coisas? É preciso, antes de mais, investir na educação ambiental das populações. Estou a pensar, por exemplo, em campanhas de sensibilização para a necessidade de proteção das florestas, semelhantes àquelas que se desenvolvem no âmbito da prevenção dos acidentes rodoviários ou da separação do lixo para reciclagem. Com campanhas desse género, sistemáticas em termos temporais e que abarcassem uma componente educativa em áreas como a fauna e flora, poderiam potenciar-se práticas mais amigas da floresta, uma consciência cívica e ambiental que atenuasse a separação entre os aglomerados urbanos e o mundo rural e ainda a formação de uma consciência coletiva para a necessidade de defesa da floresta. Dessa forma, a nossa sociedade não seria tão indiferente aos crimes contra a floresta, que, a cada ano que passa, se vão sucedendo e aparentemente passam impunes.
Ao mesmo tempo também é necessário investir no ordenamento da floresta e tomar medidas de natureza jurídica, judicial e política que combatam os negócios que aparentemente gravitam à volta dos fogos: o imobiliário, o comércio de madeira e o dispositivo de combate a incêndios.
Estou convencido que medidas deste género poderiam contribuir para proteção dos ecossistemas, para promover um desenvolvimento mais harmonioso do país e para garantir a sustentabilidade de setores económicos que dependem da floresta, como por exemplo, o da indústria do mobiliário.

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