domingo, 6 de novembro de 2011

O não referendo na Grécia é uma lição para a Europa

O que se passou esta semana na Grécia espelha bem o estado de desnorte em que vive esta nossa Europa. Uma Europa de instituições ausentes, sem voz de comando, com líderes fracos e com medo da opinião dos europeus. Uma Europa onde o eixo franco-alemão tomou de assalto o poder de forma ostensiva e desconcertante. Sem qualquer parcimónia ou respeito institucional... 
A actuação do consulado “MerkoSarkozy” não me agrada porque julgo que actua ao arrepio dos princípios fundadores da União Europeia. Que saudades do tempo em que a Inglaterra fazia frente à cruzada franco-alemã...
Mas deixemos os desabafos e vamos ao que importa.
Que primeiro-ministro grego é este que numa semana assina com os parceiros europeus um novo plano de assistência financeira, que a garante a sobrevivência do seu país a prazo, e que na semana seguinte, de forma inopinada, manifesta intenção de submeter a referendo popular o acordo que assinou?
É um líder fraco e um estadista sem estatura.
Não critico a decisão de ouvir o povo, porque esse é um gesto normal em democracia. Mas na situação em que a Grécia se encontra foi uma atitude quase suicida.
É evidente que em termos pessoais/políticos a atitude de George Papandreu até pode ser compreensível. De facto, no xadrez político grego, Papandreu é um homem só - até no seu próprio partido é criticado e não reúne consensos - e perante o clima de instabilidade e convulsão que graça no país só lhe restava mostrar aos seus pares que, apesar de tudo, com ele está a maioria do povo. Desta forma, pelo voto popular, em referendo, veria legitimada a sua politica de austeridade e ganharia novo folgo para continuar no exercício do cargo, aplicando no terreno o acordo que assinou com os seus parceiros europeus. O problema é que no estado de emergência em que se encontra a Grécia (e toda a Europa se quisermos), em permanente escrutínio dos mercados e nas mãos vorazes dos especuladores, uma decisão destas, poucos dias depois de ter sido aprovado novo plano de ajuda financeira, foi um autêntico salto para o precipício. E não foi uma decisão natural. Natural seria, quando muito, antes de assinar o compromisso com os países da zona euro, saber até onde os gregos ainda admitem levar os seus sacrifícios. Isso sim. Nunca nas condições em que o foi, na véspera de uma cimeira do G20, em que a Europa iria suplicar ajuda aos outros gigantes da economia mundial, através da participação no FEEF, um fundo constituído precisamente para ajudar a Grécia e outros estados membros que se encontrem em dificuldades.
Esta foi uma atitude impensada, irreflectida e só possível no quadro de uma Europa fraca e sem liderança. Alguém concebe que esta atitude, no mínimo desleal, tivesse sido tomada no tempo em que Jaque Delors era presidente da Comissão Europeia? E no tempo de estadistas europeus como Francois Mitterrand, Margaret Thatcher, Filipe Gonzales ou Mário Soares?
Não, com certeza que não. Nesses tempos a estirpe dos políticos era diferente e havia o sonho de construir uma Europa unida, baseada em compromissos sólidos, assentes na solidariedade inter-estados.
Hoje já não parece ser assim, parece que estamos a querer transformar a Europa em coutadas e num palco de vaidades pessoais. Esta Europa fraca, pouco exigente em termos de compromissos colectivos e dada a orientações de directórios e não instituições, permite que surjam atitudes como esta agora tomada pelo primeiro-ministro grego.
Felizmente George Papandreu, já desistiu da sua proposta e ao que parece prepara até a sua saída de cena. Mas ainda assim, fica a lição deste episódio, que poderia ter tido consequências mais graves, além das que teve, nomeadamente ao nível dos mercados financeiros.
Para além disso, fica também a lição para os actuais líderes europeus, nomeadamente os do eixo franco-alemão, que mais uma vez tiveram uma intervenção reactiva (em termos que até achei, em alguns aspectos, pouco adequada – é bom que não nos esqueçamos que a Grécia ainda é um país soberano) e não activa como se exige, numa atitude de antecipação aos problemas e não de uma reacção, muitas vezes tardia e a reboque dos mesmos.
Uma postura de liderança fria, autoritária, não legitimada e pouco institucional, como a meu ver tem sido posta em prática por Merkel e Sarkozy, podem levar a que surjam atitudes rebeldes, impensadas e pouco desejáveis como a tomada por Papandreu.
Portanto o refendo, que o não chegou a ser, pode ser uma lição para a Europa.

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